A importância das Teses
Para influenciar a estratégia, nossos racionais precisam ser extremamente bem estruturados e robustos. Não podemos deixar dúvidas de que a empresa deveria priorizar o que estamos propondo.
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Desde o início da minha carreira — quando atuava como Designer — sempre tive certa curiosidade para entender os motivos que estavam por trás dos projetos e iniciativas que chegavam até mim. Quando comecei a atuar na gestão de produtos, senti ainda mais a necessidade de ter esta lógica muito clara — mais do que curiosidade, era de fato algo essencial para meu trabalho. Eram sempre muitos caminhos possíveis e ter um entendimento mais abrangente me permitia fazer escolhas com mais confiança.
De maneira bem prática, uma das primeiras lembranças que tenho sobre esse assunto foi na época em que liderava o produto globoesporte.com. A liderança da Globo — e principalmente o executivo para quem eu reportava — tinha esse aspecto muito forte. Essa imprescindível que a gente construísse bons racionais para qualquer ideia que quiséssemos defender.
A partir daí essa premissa se tornou parte crucial do meu trabalho. Esse processo de criação de racionais bem estruturados e embasados pode ser consolidado no que chamamos aqui de Teses — e é sobre isso que falo hoje.
O que é uma tese?
De maneira bastante simples, Tese é a declaração de uma proposta de intervenção em alguma variável do sistema (processo, política, tática, preço, canal e obviamente produto) e do seu impacto esperado em um indicador ou alavanca prioritária do negócio.
Na prática, uma tese é uma hipótese1 — ou seja, é algo a ser validado na prática — porém com foco claro no impacto direto para o negócio.
É importante ter em mente que, quanto mais alta é nossa intenção, mais robustos precisarão ser os nossos racionais. Não estamos falando aqui sobre o resultado de uma dinâmica de ideação ou um insight que foi construído a partir de algumas poucas entrevistas com usuários ou clientes. Estamos falando sobre evidências fortes, obtidas em escala ou que sejam quase “irrefutáveis” — que vão nos dar um nível de confiança suficiente para que a empresa considere aportar seus recursos e seu foco (duas coisas cada vez mais escassas).
Como nascem as teses?
Eu costumo monitorar sempre quatro lugares que, pra mim, são grandes fontes de insights — que invariavelmente podem se transformar em argumentos robustos para embasar uma tese que tenha impacto para o negócio.
O mais óbvio, porém não menos importante que os demais, são os clientes e usuários. É super importante pra mim estar próximo destes atores constantemente (e não apenas em momentos de validação), escutando e observando seu comportamento. Entender dores, percepções e necessidades normalmente é um bom ponto de partida para investigações mais profundas.
Outra boa fonte é o conhecimento que já existe dentro da empresa, nas pessoas. Conversando com áreas essenciais para a entrega de valor do negócio (como comercial, operação, marketing, atendimento ao cliente, etc.) conseguimos levantar muitas hipóteses — algumas mais e outras menos relevantes. Se fizermos as perguntas certas, mantivermos um canal aberto e se tivermos um bom sistema para filtrar as informações, esta pode ser uma fonte riquíssima de insights diretamente relacionados com o que o negócio precisa2.
O terceiro "lugar" pelo qual gosto de passar sempre é pelo próprio produto. E aqui dois tipos de monitoramento são potenciais fontes de insights relevantes: 1) a análise sob o ponto de vista de entrega de resultados do produto para o negócio e 2) uma análise a partir de um ponto de vista mais técnico, monitorando aspectos como performance e experiência de uso3.
A quarta fonte — e a mais importante para mim dentro do propósito deste texto — está nas informações sobre o negócio e a estratégia da empresa.
Monitorar e aprofundar o entendimento sobre os pilares do negócio, suas prioridades e, principalmente, o seu desempenho, é o que provavelmente irá gerar as informações mais relevantes sobre oportunidades e problemas para serem atacados.
Normalmente conduzo esse processo utilizando algumas ferramentas que pra mim são valiosíssimas — por exemplo: árvore de receita/alavancas, relatórios de desempenho do negócio, matriz SWOT, Mapa Estratégico (ou OKRs ou qualquer outra ferramenta de declaração de objetivos e metas) e relatórios de análise competitiva.
Depois de levantar as oportunidades, precisamos fazer uma análise mais profunda sobre se, de fato elas possuem um potencial relevante de criar impacto para o negócio. E, no caso de termos várias ideias à nossa frente, precisamos de critérios claros que nos permitam fazer uma priorização entre elas — para saber no que trabalhar primeiro.
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Como declarar uma tese
Depois de levantar as oportunidades e avaliá-las, precisamos estruturá-las — pois para que a gente consiga tempo e recursos da empresa para trabalharmos nas nossas ideias vamos precisar envolver diversos atores — stakeholders, liderança executiva, nosso time e outras equipes que nos ajudarão na execução.
Ao longo da minha carreira fui aprendendo que o tipo de informação e o nível de detalhamento/especificidade que decidimos colocar, em qualquer tipo de documento, é pode engajar ou dispersar as pessoas com quem estamos falando — independente do conteúdo que estamos apresentando. E isso vale principalmente quando estamos falando com níveis executivos dentro de uma empresa.
Por isso, pensar bem em como vamos declarar nossas teses é essencial para termos mais chances de resultados melhores.
Não acho que precise existir uma estrutura única ou um template — é importante estarmos flexíveis ao contexto e ambiente em que estamos atuando. O importante é que seja enxuto e conciso, dando transparência para os principais pontos do que queremos comunicar.
No entanto, eu gosto de garantir que certos conceitos sejam endereçados independente de que estrutura e formato seja adotado. Entre eles, a declaração sobre o quê estamos tentando resolver e para quem (embasado com evidências e fatos); qual o impacto real esperado; como pretendemos medir o sucesso ou progresso da execução da iniciativa caso ela seja priorizada, e se já temos alguma ideia sobre caminhos de soluções possíveis — como forma de materializar algo que pode ser muitas vezes genérico ou teórico demais.
Em uma empresa de bens de consumo — na qual atuei na liderança de produto — , percebi logo nos primeiros dias após minha entrada que usávamos documentos extremamente detalhados de planejamento e especificações. E estou falando aqui de uma empresa de tecnologia, uma scale up. Eu consegui explicar para o C-level que ambientes de inovação e alto crescimento (como o nosso) possuem muita incerteza e riscos, e investir logo de cara em soluções entendidas como certas prematuramente pode fazer com que a empresa acabe desperdiçando muito dinheiro e tempo — sem sair do lugar. E no desdobramento dessa conversa, o conceito de teses a serem validadas caiu como uma luva.
Ouvi de um dos executivos principais: "é como uma startup dentro da startup".
A forma de estruturar uma tese também depende de quem fará parte do processo de comunicação.
Pra quem mostrar?
Essa pra mim é a parte mais legal — mas também a mais difícil. Uma tática que eu passei a adotar é de já envolver stakeholders e lideranças principais o quanto antes na discussão. Isso ajuda a trazer comprometimento e não perder muito tempo com idas e vindas.
No começo do mapeamento e definição das teses, costumo envolver mais alguns representantes de cada competência, como por exemplo um tech lead pela engenharia, um designer, uma analista de dados.
E à medida que vamos progredindo envolvemos o restante do time e stakeholders, até que todos estejam bem alinhados.
Tão importante quanto alinhar com líderes, é garantir que as pessoas que trabalham na iniciativa saibam muito bem o que se está tentando atingir e o porquê.
O que muda quando trabalhamos orientados a teses?
Um processo como esse nos permite estar mais conectado com as prioridades da empresa, ser mais eficiente com uso dos recursos e aumenta a probabilidade de conseguirmos gerar resultado mais rápido.
Para citar o exemplo de uma outra empresa — desta vez um produto de varejo de moda/vestuário em que atuei como executivo — consegui ver claramente os efeitos acima acontecendo ao mudarmos nossa abordagem de trabalho.
Apesar de termos uma estratégia de médio/longo prazo bem definida, não tínhamos na empresa um processo que nos permitisse atuar de maneira mais flexível no curto prazo.
Mexendo um pouco no processo — que tinha como um dos pilares a utilização de teses para validação — conseguimos identificar diversas oportunidades de rápida implementação, que trouxeram resultados imediatos, impactando através do produto algumas métricas importantes para o negócio.
Esse tipo de coisa acaba gerando um ciclo virtuoso, porque uma vez que conseguimos começar a mostrar resultados significativos, emitimos a mensagem de que temos capacidade atuar de maneira estratégica e responsável sobre orçamento, gestão de recursos, previsibilidade, risco e retorno.
E isso dá a confiança necessária para os níveis mais altos da empresa de que esse é um modelo de trabalho que vale a pena investir como modus operandi.
Todo mundo deveria ter uma tese
Costumo dizer que os times que querem atuar com alto nível de autonomia precisam ter controle na prática sobre como criam e desenvolvem suas próprias soluções. Por isso é fundamental que cada pessoa integrante da equipe se sinta capaz de identificar, propor e criticar as teses. Para que seu trabalho tenha propósito e intenção.
O que muitas vezes acontece é quando o time não toma as rédeas e ocupa este espaço, naturalmente e obrigatoriamente os líderes e executivos passam a fazê-lo.
Por onde começar?
Mais importante que onde e como — é apenas começar. Um caminho que costumo recomendar neste início é ter conversas com pessoas de diversas áreas da empresa, para entender pontos de vista e quais são as teses e apostas que elas possuem — que podemos levar adiante ou colaborar para que elas saiam do papel.
Vale também abrir um documento de texto (ou pegar uma folha de papel) e anotar coisas sobre seu processo de trabalho: evidências, o que o time está tentando resolver, porque acham que isso é importante, quais soluções possíveis e como irão medir o resultado. E depois refletir sobre o que deu ou não certo e o que faria diferente.
Isso vai dar origem a novas ideias, mais frescas e potencialmente mais robustas. Quanto mais exercitamos, melhores vamos ficando.
Por último, buscar contribuições e feedback é uma prática importantíssima. Vale sempre escrever alguns parágrafos com nossas ideias/argumentos e compartilhar com outras pessoas — isso vai ajudar a trazer pontos de vistas diferentes e automaticamente vai melhorar nossos racionais.
Alexandre Nigri é sócio da Produtos para Humanos e trabalha há mais de 20 anos em produtos digitais — mais da metade deste tempo atuando como executivo de Produto e Design. Passou por empresas como 99, iFood, Dafiti, Globo.com, Grupo Zap (OLX) em posições de C-level e Diretoria Executiva. Atualmente é Global Product Manager na Syngenta. Mais →
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Por que chamamos as teses de teses? Entenda lendo este texto.
Sempre tomando o cuidado para não criar expectativas com estas pessoas de que iremos desenvolver de cara as propostas — mas que são ideias e hipóteses que nós ajudaremos a validar de maneira estruturada.
O time de engenharia / desenvolvimento de software é fundamentais aqui. Provavelmente têm ótimas ideias, mas são pouco ouvidos. Incluí-los desde o início no processo dá a oportunidade de atacarmos débitos técnicos e melhorias de performance que também podem trazer melhorias importantes no produto que viabilizem ou tragam diretamente resultados de negócio.