3 passos para tomar decisões melhores
Estão abertas as inscrições para as turmas de agosto do Workshop Decisões para Humanos. O texto que escrevemos para esta newsletter é um dos tópicos que abordamos ao longo do evento.
No final do mês de julho nós rodamos as duas primeiras turmas do Workshop Decisões para Humanos. Nós ficamos surpresos demais com a resposta que tivemos:
36 pessoas inscritas no total;
Participaram tanto profissionais de Design quanto de Gestão de Produtos, das 5 regiões do país — e uma pessoa desafiando o fuso direto da Alemanha;
Tivemos pessoas de empresas como Mercado Livre, Itau Unibanco, Magalu, OLX, Boticário, Picpay, Stone, Kavak e várias outras;
Recebemos um número de inscrições através de indicações que pra nós foi expressivo demais, superior a 20% do total de participantes. Dado que eram as primeiras turmas, as pessoas recomendaram o workshop mesmo sem ter passado por ele — e isso pra nós foi surpreendente.
Alcançamos a meta que definimos ao lançar o workshop: ter 25% das pessoas participando com nossas bolsas. Foram 9 pessoas, todas elas com bolsas de valor integral.
Mas não só isso. A gente honestamente não esperava uma reação tão legal das turmas ao entrar em contato com o conteúdo e as ferramentas que apresentamos — que são de nossa criação. Como eu falei numa das turmas — a gente não tá repassando o modelo de nenhum dos gurus de Produto do mercado. Estamos colocando algo completamente nosso pela primeira vez em teste — estávamos correndo um risco relativamente alto ali.
Felizmente deu tudo certo. Saímos destas 10 horas de workshop confiantes de que criamos algo realmente útil e relevante para as pessoas que estavam ali. E de que, principalmente, vale muito a pena criar conteúdo original.
Acho que as pessoas conseguiram sentir o tamanho do cuidado que tivemos ao pensar e produzir tudo o que produzimos. Todo o contexto que criamos foi essencial pra termos conseguido criar um ambiente de aprendizado real em cada turma. Isso passou pelos argumentos que apresentamos, os exemplos que utilizamos (que passou longe da tradicional didática pautada em Jeff Bezzos, Steve Jobs ou Elon Musk), as reflexões que provocamos e o diálogo que travamos ao longo dos dois dias de curso.
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3 passos para tomar decisões melhores
Uma das discussões mais interessantes que tivemos nessas duas turmas do nosso workshop foi sobre a maneira como enxergamos e avaliamos as nossas decisões. De nada adianta ter um processo estruturado e robusto pra dar mais clareza às nossas decisões se não estamos com a nossa cabeça no lugar certo. Se criamos expectativas inalcançáveis ou se partimos de um ponto de extrema confiança ou extremo desconforto. Tudo isso influencia demais na qualidade do processo — e dos resultados das nossas decisões.
Nesta parte do workshop nós passamos pelas mudanças de pensamento e comportamento que são necessárias para que o processo todo possa correr melhor. São basicamente 3 passos a cumprir:
Desistir de querer ter certeza sobre qualquer coisa;
Parar de tentar tomar decisões certas;
Começar a se importar com as consequências da sua decisão mais do que com a decisão em si.
1. Desista de querer ter certeza sobre qualquer coisa
Benjamin Franklin escreveu certa vez que “as únicas certezas que temos na vida são a morte e os impostos". Eu costumo adaptar essa frase falando que a única certeza que a gente tem na vida é que os boletos vão chegar no final do mês — e eles nunca falham.
Pessoas de produto precisam navegar em contextos de alto nível de incerteza — esse é um pré-requisito essencial para a nossa profissão. Muitas vezes estamos implementando conceitos que nunca foram testados ou sobre os quais temos pouca ou nenhuma informação para embasarmos nossas hipóteses. Entender e estar em paz com esse contexto, em que não existe certeza sobre absolutamente nada, é realmente importante pra que a gente consiga tomar decisões tirando o máximo de proveito das situações em que estamos.
Basicamente, nós precisamos naturalizar isso como um fato e não algo contra o qual lutamos eternamente — porque vamos perder todas as vezes. Frustração garantida.
A autora Anne Duke fala que o “não tenho certeza de nada” é uma representação muito mais precisa da realidade do que o seu inverso. Na vida, e principalmente no trabalho, não deveríamos ter nenhuma expectativa pela certeza de algo, simplesmente porque nunca vamos ter clareza total sobre os fatos. Mesmo decisões simples podem ter múltiplas variáveis sobre as quais não temos controle da influência — sem contar as variáveis que ficam de fora da nossa análise porque não conseguimos mapeá-la.
Além disso, nosso "potencial de certeza" é bastante influenciado por questões como ego, expectativas desproporcionais ou pressão por resultados.
Esse certo nível de insegurança em que ficamos quando não temos certeza de algo nos faz ficar muito mais atentos, o que é na verdade premissa básica para uma boa decisão. Quando estamos seguros, ignoramos sinais que poderiam contribuir para levantar novas hipóteses ou invalidar o caminho que estamos seguindo. Estar mais atento permite que a gente busque mais informações no ambiente e leia com mais racionalidade e menos apego. Sem a necessidade de estarmos certos, abraçamos mais facilmente outros pontos de vista, mesmo que sejam contrários aos nossos.
2. Pare de tentar tomar a decisão certa
Quando olhamos para uma decisão ruim tomada no passado — por nós mesmos ou por outras pessoas — normalmente é bem fácil chegar à conclusão que o caminho tomado deveria ter sido outro.
Quando isso acontece com a gente, a nossa autocrítica chega correndo aos berros e os engenheiros de obra pronta aparecem apontando todos os dedos possíveis. Mas o fato é que não precisa ser nenhum prodígio para sacar o que deu errado em algo que já aconteceu.
Como bola de cristal não é uma das nossas ferramentas de trabalho, precisamos naturalizar que não existe, pela própria natureza da coisa, algo como decisão "certa" ou "errada". Nós usamos as informações e ferramentas que temos à nossa disposição para acertar o mais próximo do nosso objetivo. E ficar em paz com seus resultados, mesmo que sejam diferentes do que esperamos.
Dá pra entender porque vivemos de certa forma obcecados por ter as respostas certas. As raízes disso vão longe e passam tanto pelo mundo empresarial como pela dinâmica do mundo acadêmico.
A busca sem limites das empresas por otimização e zero tolerância a erros instalou uma paranóia em todo mundo. Criou ambientes altamente competitivos, reduziu o papel de líderes a basicamente a função de vigilantes e mantenedores da ordem — ou seja, que todos saibam exatamente o que precisam fazer o tempo todo. Tudo isso suportado pelos processos de RH, que — até hoje — atuam a partir da abordagem do castigo ou recompensa.
Até bem pouco tempo atrás não era raro encontrar no chão de fábrica de algumas empresas, para as quais estávamos fazendo algum projeto, pôsteres ou swags de RH com a frase "Faça certo da primeira vez" (tradução de "do it right the first time" ou DRIFT). Esse conceito foi criado por Philip Crosby, uma espécie de guru do tema qualidade e virou mantra da indústria dos EUA nos anos 70. Essa obsessão pouco saudável foi uma reação ao crescimento da dominância do Japão em produtos manufaturados na época, principalmente carros.
No cenário acadêmico, por outro lado, ter a resposta correta alicerça basicamente todo o funcionamento do sistema. Não só isso, existe a crença de que existe só uma resposta certa possível para cada pergunta.
O sociólogo e escritor Howard Becker faz uma análise desse mundo que eu gosto muito:
Para os estudantes, os professores, seus legítimos superiores hierárquicos, nunca reescrevem nada; fazem certo já da primeira vez — ou pelo menos é o que lhes permitem enxergar. Alunos aprendem e realmente acreditam, pelo menos por algum tempo, que os "escritores de verdade" (ou "gente inteligente de verdade") fazem certo de primeira. Só os otários precisam refazer. Essa pode ser mais uma versão da mentalidade de teste: a habilidade de acertar na primeira vez mostra uma capacidade superior.
Voltando ao nosso caso, é muito injusto que a gente enxergue o resultado de uma decisão como algo binário, certo ou errado, bom ou ruim. Principalmente se seguimos alguma estrutura que nos dê clareza sobre as potenciais consequências — positivas e negativas.
Uma decisão que não gerou os resultados que estávamos esperando não deveria ser considerada automaticamente errada.
Ter um processo estruturado — como o que a gente propõe no nosso modelo — sempre nos ajuda a andar em direção ao resultado que esperamos, mesmo que ele não seja atingido logo de cara. Uma sucessão de decisões informadas vai gerar aprendizados importantes, que viabilizem próximos passos mais rápidos, conscientes e com mais chance de chegar onde queremos.
3. Comece a se importar mais com as consequências do que com a decisão em si
Uma decisão não tem fim em si mesma; são as consequências — e o que fazemos quando elas aparecem — que mostram se o nosso trabalho gerou algum impacto positivo.
Seguindo o mesmo exemplo do tópico anterior, uma decisão que teve resultados ruins pode não apenas ser válida, como pode ser considerada boa — ou até ótima —, dado aquele contexto em que foi tomada.
Em nosso processo de produção de conteúdo, isso foi algo com o qual nos preocupamos muito. Tentamos, ao aprofundar o nosso modelo, criar uma estrutura que passasse de maneira suficientemente exaustiva pela análise dos cenários possíveis para cada uma das opções que temos em mãos.
É importante dizer que um processo de tomada de decisão não é uma jornada para encontrar a solução perfeita para um problema. É a escolha da melhor alternativa dentre aquelas que levantamos — e isso muda faz muita diferença.
Até a próxima edição.